Para lideranças do setor bancário, as empresas de tecnologia se beneficiam de regulação mais favorável, com menos obrigações e carga tributária menor (Por Marcelo Mota e Aline Bronzati)
O primeiro dia do Ciab, tradicional evento do setor bancário, foi marcado pelo clamor das instituições financeiras tradicionais por um tratamento mais igualitário em relação às novas empresas participantes do sistema financeiro. Como são considerados como instituições de pagamentos (IP), os “novos entrantes” desfrutam de uma carga tributária mais leve e não precisam cumprir obrigações operacionais exigidas dos bancos, como o recolhimento compulsório de depósitos.
“Existe uma assimetria regulatória a ser cuidada. Há bancos disfarçados de IP ou de startup”, disse o presidente do Banco do Brasil (BB), Fausto Ribeiro. O executivo adotou um tom mais enfático sobre o tema no painel de abertura do evento que reuniu os seis presidentes dos maiores bancos tradicionais. Neste ano, o encontro foi realizado em formato semipresencial por causa da pandemia.
O presidente da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), Isaac Sidney, como anfitrião do evento, reforçou o pleito. “Não somos como alguns que estão crescendo bastante, que já alcançaram o tamanho de bancos, parecem bancos, agem como bancos, mas preferem se dizer apenas empresas de tecnologia.”
Segundo Sidney, os bancos investem em torno de R$ 25 bilhões por ano em tecnologia. “A infraestrutura bancária no Brasil é uma das maiores do mundo, capaz de suportar mais 90 bilhões de transações a cada ano.”
Os presidentes dos outros cinco maiores bancos do País, que também participavam do painel de abertura, fizeram coro, sem deixar de valorizar a agenda de aumento da competitividade no setor promovida pelo Banco Central.
“Somos absolutamente a favor da competição. O Itaú é o Itaú por causa de Bradesco, Santander, Caixa, que também são o que são por causa da concorrência”, afirmou o presidente do Itaú, Milton Maluhy. “Mas também somos a favor de isonomia, de condições de igualdade.”
Sergio Rial, presidente do Santander Brasil ressaltou que o Brasil precisa de um marco regulatório que promova a concorrência. “É fundamental para que a economia brasileira tenha bases muito mais homogêneas”, disse. “Essas instituições fizeram investimentos vultosos para chegar nesse patamar e isso tem que ser respeitado”, disse o executivo, em referência aos bancos tradicionais.
Os banqueiros também cobraram o compartilhamento de informações não só por parte dos bancos, mas também de outros setores como, por exemplo, o varejo. “Temos de abrir a base de dados das varejistas. Não só dos bancos”, reforçou Rial, chamando atenção para a importância de um modelo aberto de finanças (chamado de open finance). O conceito vai além do open banking, sistema que vai permitir o compartilhamento dos dados bancários dos clientes.
Já o presidente da Caixa Econômica Federal, Pedro Guimarães, lembrou que, apesar do esforço de digitalização, existem clientes que não têm acesso a smartphones, computadores ou a uma boa rede de internet. Por isso, a Caixa vem abrindo agências, para dar vazão às necessidades de clientes em regiões onde a digitalização não os atende bem, principalmente no Norte e no Nordeste.
ESG
Octavio de Lazari, presidente do Bradesco, disse que a pandemia funcionou também como um catalisador da agenda socioambiental conhecida pela sigla em inglês ESG (que se refere aos critérios ambientais, sociais e de governança). “A pandemia acabou sendo um acelerador, jogou luz de maneira mais contundente. “A sociedade em geral não pode mais virar as costas para isso”, disse.
Contudo, o presidente da Caixa chamou atenção para a necessidade de aprofundar a operação de microcrédito no Brasil. “Pode botar o que for para preservar floresta, sem microcrédito vai adiantar zero”, afirmou Guimarães. “Tem que ter o outro lado social. Se as pessoas não tiverem utilização desse dinheiro e não puderem se sustentar de maneira real, vão para a devastação, não tem jeito.”
Para o presidente do BB, a agenda ESG representa o futuro das empresas. “Não é só o lucro momentâneo”, disse. “Temos de encontrar melhores caminhos e abordagens e precisamos rapidamente formar nossos líderes [sob a ótica ESG]”.
“As empresas podem abraçar essa agenda de maneira burocrática”, disse o presidente do BTG Pactual, Roberto Sallouti. “Mas o que a gente tem percebido é que, quando a incorpora em sua matriz, gera valor financeiro para investidores e para seus clientes.”
Para o executivo, a agenda ESG contribui para a geração de novos produtos rentáveis, uma vez que entra no núcleo da operação. Ele citou como exemplo um produto que está sendo lançado pelo BTG. “Somos um dos maiores gestores de florestas comerciais do mundo. Agora vamos comprar áreas degradadas. Metade será floresta comercial, metade nativa.”
Fonte: Estadão