Para Erika Kokay (PT-DF), ao nomear personal trainer com salário de R$ 30 mil, presidente do banco público usa cargo para atender interesse privado e desrespeita corpo de profissionais do banco
São Paulo – A deputada federal Erika Kokay (PT-DF) entrou com duas representações, uma na Comissão de Ética Pública da Presidência da República e outra no Ministério Público, contra a contratação, pelo presidente da Caixa Econômica Federal, Pedro Guimarães, de seu personal trainer, Cleyton Carregari, como consultor da presidência da instituição. Segundo ela, além de ser uma nomeação em cargo público para fins de atender interesses privados, a nomeação rompe o critério da impessoalidade e representa um desprezo para com a capacidade técnica da Caixa. “Um personal trainer não tem a capacidade técnica para exercer a função. E recursos públicos estão sendo utilizados para pagar indevidamente o salário de alguém”, diz.
A parlamentar comentou também o ambiente no qual o governo quer acelerar as privatizações. De acordo com o jornal Valor Econômico, as principais estatais brasileiras registraram crescimento de 132% em 2018, com lucro líquido na ordem de R$ 74 bilhões, mas a gestão de Jair Bolsonaro atribui essa expansão a um processo de redução das despesas e vendas dos ativos desde 2016.
Sobre a “reforma” da Previdência, cuja tramitação deve ser retomada na próxima terça-feira (7) em comissão especial da Câmara, Erika afirma que a esquerda vai trabalhar as contradições do governo, mas acha fundamental que a população “tenha consciência das ameaças que essa reforma representa e possa fazer uma pressão de fora para dentro, o que aconteceu no governo Temer.” Ela lembra que, no governo anterior, a reforma “estava pronta para ir ao plenário e não foi”.
O principal argumento das representações é a nomeação em cargo público para fins de atender interesses privados?
Além disso, é o rompimento do critério da impessoalidade. Contrata-se um personal trainer em função de relações pessoais. Gestão pública tem que ser pautada, entre outros requisitos, pela impessoalidade. Ela está rompida e, ao mesmo tempo, isso representa um desprezo para com a capacidade técnica. Um personal trainer não tem a capacidade técnica para exercer a função. E recursos públicos estão sendo utilizados para pagar indevidamente o salário de alguém.
Espera um retorno adequado da Comissão de Ética e do Ministério Público?
Se há princípio republicano no Brasil e de respeito ao Estado democrático de direito, não tem como essas duas representações não derivarem para ações, tanto da Comissão de Ética quanto do MP. Ele chegou a dizer que o personal trainer é uma pessoa em quem ele confia e, portanto, é de caráter pessoal, de uma relação privada; segundo, que ele seria importante para auditar os patrocínios. Ora, a Caixa tem um corpo técnico altamente qualificado, de pessoas concursadas, que têm todas as condições de fazer qualquer tipo de auditagem. Quem não tem condições é o personal trainer. Ele não tem formação adequada para fiscalizar e auditar patrocínios de uma empresa financeira.
Por falar em empresa pública, o jornal Valor divulgou estudo segundo o qual as principais estatais registraram crescimento de 132% em 2018. Agora, o governo deve dar grande ênfase à venda de ativos das empresas. Como interpreta a situação?
Existem várias formas de dilapidar patrimônio público. Uma é a privatização pura e simples. A outra é a privatização corroendo o vigor das empresas. Venda de ativos, privatizar coligadas, loterias, ou venda do pré-sal, como é feito pela Petrobras. Uma política de corroer a força das empresas públicas e entregá-las ao mercado. E tem a privatização da própria gestão.
No Conselho de Administração, o presidente do Banco do Brasil (Rubem Novaes) disse que a empresa estaria melhor se estivesse privatizada. E disse que vai mitigar o problema do prejuízo de o banco ser público ao colocar pessoas do mercado, da iniciativa privada. Vamos entrar também com representação contra isso. Ele esquece que a Caixa e o Banco do Brasil estão entre as empresas que mais lucram no Brasil, disputam mercado, têm atividade econômica e são autônomos, mostrando que a atuação comercial não é colidente com a função de crédito produtivo e social.
Nesse contexto, quais as perspectivas da frente parlamentar em defesa das empresas públicas?
Vai ser lançada dia 8 de maio a Frente Parlamentar em Defesa dos Bancos Públicos.
Como está a articulação para enfrentar a reforma da Previdência na Câmara?
Vamos utilizar todos os instrumentos possíveis regimentalmente para tentar barrar.
Politicamente, é possível barrar a reforma?
Já está constatado que a reforma não vai sair como entrou. Vai-se isentar o trabalhador rural, o BPC, então a reforma já não vai sair do mesmo tamanho. Mas trabalhamos para que não tenhamos a aprovação da reforma, até porque é preciso fazer outras discussões. Sobre sonegação, acerca da taxação das grandes fortunas, de lucros e dividendos. Não se pode tratar a lógica púbica com a lógica pura e simples do déficit. A política pública tem que ter a participação do Estado como prevê a própria Constituição para a Seguridade Social. A política protege 82% dos idosos, através da aposentadoria ou do BPC.
Se esse raciocínio da reforma se estende para a saúde, vão ser fechados serviços; se se estende para a educação, vão ser fechados serviços, o que o governo já anuncia, dizendo que nas faculdades e universidades só devem entrar quem tem dinheiro para pagar. É uma política de desconstrução dos pactos de proteção social. E a reforma da Previdência vem para consolidar um modelo de primazia do capital improdutivo, do rentismo, na economia nacional. Essas discussões precisam ser postas. A prioridade não é reduzir o acesso da população às políticas públicas. O sistema de capitalização está sendo revisto em 15 países e o Brasil quer impor esse regime que já mostrou seu próprio fracasso.
A oposição depende do Centrão para barrar a reforma na Câmara?
A esquerda vai trabalhar para que não tenhamos a reforma. Nós trabalhamos com as contradições da base governista, porque é importante construir maioria para derrotar a proposta. No governo Temer, a reforma estava pronta para ir ao plenário e não foi. O que é mais fundamental é a compreensão da população do dano que essa reforma vai provocar a ela mesma, que tenha consciência das ameaças que essa reforma representa e possa fazer uma pressão de fora para dentro, que foi o que aconteceu no governo Temer. Trabalhamos de forma concreta para disputar a narrativa, porque a narrativa do governo não se sustenta. Não é reforma contra privilégios e não assegura futuro a quem quer que seja.
por Eduardo Maretti, da RBA