Uma procuradora do MPT (Ministério Público do Trabalho) em Campinas (SP) concedeu um parecer favorável a um sindicato que só quer dar direitos a trabalhadores que pagam contribuições. Reportagem do UOL revelou que alguns sindicatos estão fazendo isso.
Para especialistas, isso é irregular, mas o parecer da procuradora afirma que quem não contribui com o sindicato pode ficar sem receber reajuste salarial, participação nos lucros e outros direitos.
Em parecer emitido na última segunda-feira (14), a procuradora do trabalho Juliana Mendes Martins Rosolen rejeitou o pedido de abertura de inquérito contra o SindPD (Sindicato dos Trabalhadores em Processamento de Dados e Tecnologia da Informação do estado de São Paulo) argumentando que, por questão de justiça e equidade, apenas aqueles que contribuem para a manutenção do sindicato devem ter direito aos serviços assistenciais prestados pela entidade, o que inclui negociação salarial.
“(…) do contrário, haveria completo desestímulo ao pagamento da contribuição pelos trabalhadores ou mesmo exigência de serviços do sindicato sem a suficiente contrapartida”, escreveu a procuradora.
Segundo a procuradora, o sindicato cumpriu as exigências da lei, que permite a cobrança das contribuições mediante prévia e expressa autorização da categoria, em assembleia. “(…) pelos documentos acostados, salienta-se que foi amplamente divulgada a convocação para a assembleia geral (…), bem como foi garantido o exercício do direito de oposição na norma coletiva”, disse em seu parecer.
Além disso, Rosolen afirma que a reforma trabalhista aumentou os encargos sobre os sindicatos, o que resultou numa “situação caótica” em que essas entidades continuam representando toda a categoria, mas o custeio vem apenas das contribuições voluntárias dos filiados. “Trata-se de situação, por óbvio, financeiramente insustentável.”
MPT trabalha em parecer sobre o tema
O UOL entrou em contato com o MPT em Campinas para falar com a procuradora sobre a decisão favorável ao SindPD. No entanto, a assessoria de imprensa do órgão informou que a procuradora não poderia dar entrevista.
Também foi informado de que um grupo de procuradores está trabalhando em um posicionamento oficial do MPT sobre o tema. Esse documento teria o objetivo de nortear pareceres de procuradores em todo o país, mas sem retirar a autonomia deles em suas decisões, segundo a assessoria de imprensa.
Coordenador de área sindical do MPT vê irregularidade
Embora o MPT ainda não tenha um entendimento oficial sobre o tema, os sindicatos não podem conceder direitos conquistados em acordos coletivos apenas aos trabalhadores filiados, segundo o procurador do trabalho e coordenador nacional da Conalis (Coordenadoria Nacional de Promoção da Liberdade Sindical), João Hilário Valentim.
Ele afirma que a reforma trabalhista tirou a obrigatoriedade da contribuição sindical, mas não mudou nada em relação à representatividade dos sindicatos perante a categoria. “As convenções ou acordos coletivos valem para todos e as empresas são obrigadas a respeitá-los, independente de o trabalhador ser ou não associado ao sindicato”, disse.
Segundo Valentim, a conduta de sindicatos que tentam condicionar esses direitos ao pagamento de contribuições pode enfraquecer atuação dessas entidades e causar demissões de trabalhadores sindicalizados.
“A empresa pode optar por não contratar trabalhadores associados ao sindicato ou assumir uma política de dispensar esses trabalhadores. Aí pode se chegar a uma situação lá na frente na qual não há mais trabalhadores sindicalizados dentro da empresa e não tem por que [o empregador] aplicar a convenção coletiva”, declarou.
Parecer não influencia decisão do Judiciário, diz advogada
O parecer da procuradora de Campinas vale apenas para a denúncia em questão e não tem peso sobre outras decisões dentro do MPT ou do Poder Judiciário, de acordo com Helena Gomez, advogada trabalhista do escritório Motta Fernandes. Segundo ela, o parecer significa apenas que aquela denúncia não terá prosseguimento.
Caso o trabalhador não se sinta satisfeito, pode entrar com ação na Justiça para pleitear algum direito que eventualmente seja cortado por não contribuir com o sindicato, disse a advogada. “O Judiciário não está vinculado ao parecer do MPT. Um juiz pode ter entendimento diferente do procurador”, afirmou.
Fonte: UOL