Advogado e instituição dizem que, assim como obra, medida foi tomada devido a ameaças contra então presidente.
Por Ranier Bragon e Lucas Marchesini
A Caixa Econômica Federal não só custeou obras na mansão em que o ex-presidente do banco Pedro Guimarães morava em Brasília (DF), como também forneceu seguranças e uma rede de internet para o imóvel.
A Folha colheu relatos reservados dando conta de que agentes se revezavam na vigilância da casa, sete dias por semana, 24 horas por dia.
Entre outras empresas, a Caixa mantém um contrato de segurança com a Confederal, assinado em 2021, que prevê oito seguranças para a presidência do banco ao preço unitário de R$ 11,5 mil, o que representa R$ 91,4 mil por mês. Cada segurança tem um turno de 44 horas semanais, diz o documento.
Apenas o presidente tem esse tipo específico de segurança. Não há detalhamento sobre onde o serviço é prestado.
O contrato lista 116 unidades da Caixa que recebem 283 seguranças da Confederal com diferentes atribuições, jornadas de trabalho e responsabilidades. Em quase todos, há o endereço nos quais eles trabalharão.
Esse não é o caso da linha que especifica o quantitativo destinado para a presidência.
A Caixa e o advogado de Guimarães, José Luis Oliveira Lima, afirmaram que, assim como as obras feitas pelo banco estatal, o fornecimento dos seguranças foi motivado por ameaças que Guimarães teria sofrido.
“Foi uma deliberação da Caixa por uma questão de segurança do presidente da instituição“, disse Oliveira Lima.
A Caixa afirmou que disponibiliza aparatos de segurança pessoal a empregados e dirigentes “expostos a situação de risco quanto à sua integridade física, em razão do exercício de suas atribuições, por meio de adequada avaliação do grau de criticidade envolvido e da compatibilidade do instrumental necessário à prevenção de incidentes em decorrência desse risco“.
Em relação à internet, a Caixa informou que “dada a relevância do cargo, o banco disponibiliza acesso seguro, notebook e celular corporativo à presidência do banco para suas atividades laborais“.
A instituição não respondeu, porém, qual foi o contratante usado no serviço, o amparo legal, quem foi o autor da solicitação, quem autorizou, quantos agentes foram empregados, qual foi o custo para o banco e se houve precedentes, limitando-se a dizer genericamente que a medida é prevista nas normas internas e obedeceu as regras de governança.
Oliveira Lima encaminhou uma portaria da Polícia Federal que instaurou em julho de 2020 inquérito para apurar ameaças contra Guimarães feitas em grupo do Telegram em que teriam sido discutidas formas de fraude ao Auxílio Emergencial pago pela Caixa durante a pandemia de Covid-19.
A ameaça relatada na portaria é a de um perfil que sugeriu “pegar um parente” do então presidente da Caixa, “cortar no mínimo um dedo dele e mandar no endereço dentro de uma caixa de presente“. “Tiveram várias ameaças, essa é uma delas“, disse o advogado.
O inquérito investigou um ataque hacker ao presidente após o banco fortalecer as medidas de segurança para evitar golpes no pagamento do auxílio. Uma pessoa chegou a ser presa, em setembro, nos desdobramentos da apuração.
A Folha revelou na terça-feira (5) que o banco pagou a instalação de 11 postes de luz na residência de Guimarães. A instituição financeira confirmou a informação e alegou razões de segurança.
As intervenções foram feitas em julho de 2020 por quatro funcionários de uma empresa que mantém contratos com o banco público para realização de serviços de manutenção em seus prédios e agências.
Guimarães deixou a Caixa na semana passada depois do site Metrópoles revelar acusações de diversos casos de assédio sexual e moral praticados em sua gestão.
Além dele, o vice-presidente Celso Leonardo também pediu demissão sob suspeita de acobertar casos de assédio.
Guimarães era tido como um dos auxiliares mais próximos de Jair Bolsonaro (PL), sendo o recordista de participações nas lives do presidente. Foram 28 transmissões desde o início da atual gestão. A última foi na semana anterior ao seu pedido de demissão.
O ex-presidente da Caixa foi substituído por Daniella Marques, que atuava como assessora especial do ministro da Economia, Paulo Guedes. Ela prometeu contratar uma consultoria externa para apurar os casos de assédio.
Essa não será a única investigação sobre o assunto, já que o MPF (Ministério Público Federal), o MPT (Ministério Público do Trabalho) e o TCU (Tribunal de Contas da União) também iniciaram procedimentos para averiguar o que acontecia no banco sob Guimarães.
O MPT inspecionou a sede da instituição financeira em Brasília na segunda (4). A instituição também pedirá ao MPF o compartilhamento de provas obtidas nas suas investigações.
Bolsonaro transformou a posse da nova presidente da Caixa em palanque político e ignorou as acusações de assédio contra Guimarães. Segundo o presidente da República, a nova gestão será uma continuidade da anterior. A cerimônia ocorreu na terça.
Fonte Folha de São Paulo