Baixa de 43% do lucro não assusta os investidores em meio à visão de que o Itaú está se preparando bem para enfrentar a crise com o coronavírus
Bem preparado para a guerra contra o coronavírus que, por sinal, já começou. Esses foram alguns dos termos usados por analistas de mercado para classificar o Itaú Unibanco que, mesmo com a queda de mais de 40% no lucro no primeiro trimestre de 2020, viu sua ação registrar alta máxima de 6,7% na bolsa brasileira na sessão desta terça-feira (5), mas depois amenizou e fechou com ganhos de 3,70%, a R$ 22,70.
Em meio às fortes provisões por conta do coronavírus, o lucro líquido do banco totalizou R$ 3,91 bilhões de reais no trimestre, uma queda de 43,1% em relação ao primeiro trimestre de 2019. Com a queda no lucro, o retorno sobre o patrimônio líquido (ROE) foi de 12,8% no trimestre, queda de 10,8 pontos percentuais na comparação anual e o menor em 20 anos.
O banco ainda suspendeu suas projeções (guidance) para o ano de 2020 devido à baixa visibilidade sobre a extensão e profundidade dos efeitos da crise na atividade.
Conforme já havia ocorrido com o Bradesco, as altas provisões por conta do impacto do coronavírus, ao contrário do que poderia parecer, foram bem vindas pelo mercado, mostrando que as grandes instituições têm se preparado para enfrentar a forte crise que se desenha com o coronavírus, que deve se traduzir em aumento de inadimplência com a desaceleração econômica. As provisões do Itaú para possíveis calotes (créditos de liquidação duvidosa) atingiram R$ 10,1 bilhões, alta de 165% na comparação com o ano anterior, sendo R$ 4,5 bilhões especificamente como reserva adicional para a crise.
Contudo, na última sexta-feira, as ações do Bradesco tiveram queda de mais de 7%, enquanto o Itaú avança na sessão pós-resultado, mostrando que há outros motivos que explicam a diferença no balanço dos dois maiores bancos privados do Brasil.
Conforme destaca Marcel Campos, analista da XP Investimentos, a principal diferença entre as duas instituições é que a inadimplência do Bradesco teve um crescimento acima do esperado no primeiro trimestre e em todos os segmentos, levando a uma queda do índice de cobertura do banco – relação entre empréstimos inadimplentes e provisões – de 41 pontos na base anual, para 228%. Isso foi inesperado já que houve apenas cerca de 15 dias de isolamento social, com um impacto ainda não muito forte para o resultado efetivo dos primeiros três meses do ano. Veja mais sobre o balanço do Bradesco clicando aqui.
Já no caso do Itaú, a inadimplência acima de 90 dias subiu, mas apenas 5 pontos-base anualmente, para 3,1%, e o banco decidiu prospectivamente aumentar o nível de provisões para enfrentar eventuais aumentos nos índices. A formação de reservas de provisões aumentou R$ 7,3 bilhões no trimestre para R$ 47,1 bilhões.
Assim, o banco possui agora R$ 27,4 bilhões em reservas extras para enfrentar eventuais aumentos na inadimplência, levando a um índice cobertura de 239% versus 229% no quarto trimestre de 2019.
Ainda em destaque, a liquidez apresentou bom comportamento também neste trimestre, com os depósitos à vista e à prazo aumentando consideravelmente no trimestre.
Já em um movimento parecido com o registrado pelos demais bancos que divulgaram resultado (além do Bradesco, o Santander Brasil também divulgou seus números), a carteira de crédito também teve um forte crescimento de 18,9% em relação ao primeiro trimestre do ano passado e 8,9% em três meses, para R$ 769,2 bilhões.
Neste ambiente, “acreditamos que as atitudes conservadores adotadas pelo Itaú sejam necessárias, uma vez que 70% da carteira do banco é concentrada no mais arriscado segmento de varejo, e acreditamos que agora o banco esteja mais preparado para os eventuais efeitos desta crise”, destaca Campos, da XP.
E se a quantidade provisionada foi sem precedentes, Cândido Bracher, CEO do banco, destacou em teleconferência nesta terça-feira que pode haver ainda mais nos próximos trimestres. “Não temos como dizer hoje quanto tempo durará a crise, mas sabemos que vai durar muito tempo ”, disse Bracher, acrescentando que uma recuperação econômica total após a pandemia de coronavírus é improvável e apontando que a economia do país pode cair até 6,5% em 2020 com a crise.
Em meio ao cenário desafiador com o coronavírus, algumas outras iniciativas foram bem vistas pelo mercado. “Destacamos o bom desempenho do Itaú no controle de custos”, escreveram os analistas do Safra em nota. As despesas operacionais diminuíram 7%, para R$ 12,1 bilhões.
Conforme destaca a XP, a redução é especialmente importante quando se considera que o resultado não veio de reversão de provisões operacionais e possui efeito caixa, com atenção para o custo com pessoal, que reduziu 9% trimestralmente, a R$ 5,2 bilhões.
Na mesma linha, o banco Morgan Stanley avaliou que o resultado trimestral do Itaú Unibanco, excluindo as provisões e o trading, não foi ruim como poderia parecer à primeira vista: “O lucro trimestral teve queda de apenas 5,5% em comparação ao quarto trimestre de 2019, o que é um fator sazonal. Houve uma sólida expansão de 11% nos empréstimos, em comparação ao primeiro trimestre do ano passado, e as despesas operacionais recuaram 7%, o que demonstra o comprometimento do Itaú com a redução de custos”, avalia o banco americano.
Enquanto isso, o índice de capital nível I, que engloba o patrimônio dos acionistas e os lucros retidos, sofreu uma queda de 246 pontos-base no trimestre para 12%, conforme: i) ativos de risco cresceram, causando uma queda de 1,5%; e ii) pagamento de juros sobre o capital próprio, reavaliação de investimentos e efeitos de crédito tributário. “No entanto, notamos que se excluído o efeito câmbio da carteira, o índice ainda seria de aproximadamente 13%”, avalia a XP.
Por outro lado, o custo de crédito do banco no primeiro trimestre de 2020 atingiu R$ 10,1 bilhões, um aumento de 73,6% quando comparado ao quarto trimestre de 2019. O produto bancário reduziu 8,3% no trimestre.
Já a margem financeira com clientes recuou 6% na comparação trimestral e 3,8% na comparação anual, para R$ 17,045 bilhões, em função da menor receita com cheque especial por alteração regulatória vigente desde o início do ano e da redução da taxa básica de juros.
Enquanto isso, o Itaú registrou um aumento de 8,2% nas receitas com tarifas e prestação de serviços, que totalizaram R$ 11,1 bilhões. O resultado ficou 3% acima do esperado pela XP, que esperava um maior impacto da divisão de banco de investimentos, gestão de recursos e negócios relacionados a cartões.
Resiliência em destaque
Com todo esse cenário no radar, mesmo quem viu o resultado como fraco destacou que o banco tem se preparado bem para enfrentar a crise do coronavírus, como é o caso do Credit Suisse.
“Vale ressaltar que o Itaú Unibanco teve um desempenho melhor do que o Bradesco em termos de qualidade de ativos e suas provisões para os impactos da Covid-19 foram maiores que as de seus pares, provavelmente por sua base de capital mais forte”, reforçaram os analistas do banco suíço. A instituição mantém a ação ITUB4 como a sua preferida para o setor bancário no país, com preço-alvo de R$ 44 (um potencial de valorização de mais de 100% frente ao fechamento de segunda-feira) “devido à sua forte posição defensiva”, que foi reforçada com o balanço do primeiro trimestre.
O Bradesco BBI, por sua vez, segue com visão positiva para o papel, mas destacando ver tempos difíceis pela frente. Os analistas do banco cortaram as previsões de lucro em 19% para 2020, a R$ 16,6 bilhões com 13% de ROE, em 10% para 2021 (lucro de R$ 22,3 bilhões com 16% de ROE) e em 11% para 2022 (lucro de R$ 29,4 bilhões com 20% de ROE), principalmente com impacto da menor margem financeira. “Reiteramos nossa visão de que os níveis de lucratividade de antes da crise devem ser vistos novamente apenas em 2022”, apontam os analistas Victor Schabbel e Sofia Viotti.
Desta forma, a recomendação outperform (desempenho acima da média do mercado) e preço-alvo de R$ 31 (upside de 42% frente o fechamento da véspera) é principalmente baseada no valuation atrativo, com os múltiplos sugerindo um ponto de entrada interessante para os investidores de longo prazo.
“Como somos marginalmente mais construtivos sobre as perspectivas de longo prazo devido à concorrência provavelmente mais racional à frente, vemos argumentos suficientes para sustentar nossa posição positiva sobre o nome”, complementam. Já a XP reitera recomendação neutra para os ativos, com preço-alvo de R$ 30,00, o que representa um upside de 37%.
De acordo com a Bloomberg, de 20 casas que cobrem o papel, 14 recomendam compra para o ativo, enquanto 6 recomendam manutenção. A expectativa é de dias difíceis com a pandemia e o segundo trimestre pode refletir ainda mais o cenário. Contudo, a visão do mercado para a ação segue positiva em um prazo mais longo, ainda mais levando em conta o forte preparo que a instituição está fazendo para enfrentar o coronavírus.
Fonte: Infomoney